quarta-feira, 30 de março de 2016

De Tanto Amor

De tanto amor
Me despi do envólucro e rejuvenesci anos-luz
De tanto amor


Cantei, cantei, cantei...

De tanto amor
Ainda canto
De tanto amor canto mais alto

E chego agora fora de hora porque tu não estás mais
De tanto amor
Fundimos nossas almas pra sermos apenas uma

Afoguei-me em teus olhos quando chorasteEngolindo lágrimas minhas e tuasDe tanto amor

Roubei-te a luz dos olhos que a mim iluminam pelas noites infindáveis
De tanto amor
Tive sede e então bebi teu gosto doce


E toquei teu corpo livremente
E provei teu gosto 
Enquanto nos sentiamos todas as portas se abriam na brisa e no vento


De tanto amor
Já não percebia meus medos e desenraizavam-se os teus
Já descobria teus segredos únicos e persuasivos


E te sentia dentro e fora do ventre
Amordaçavas-me
De tanto amor...


Céus, então torturei-me ao deixar-te na estação 
Ainda assim te busquei em todas as horas das noites e dos dias
Ainda te busco entre as folhas secas do meu jardim


Para ser meu amor sempre 
E para sempre 
De tanto amor


Esmurrei-me, acendi,  apaguei
Que amor e este?
Se me transforma e transtorna


Redemoinho destendendo-me nervos
Para a morte de todo o sentido num forte gemido de prazer e dor
Nao sabemos que amor é este


Orgástico e desastroso
De tanto amor
Enfim adormeci para acordar-te

Corina Sátiro
 

sábado, 26 de março de 2016

Horas Retrógadas


Queimo a língua em labaredas e digo que

Nem todos os mortos são hostis.

Na agonia do limbo seco e sem flores te dão as mãos

E sem entendimento desvencilham-se dos caminhos iluminados.

Pés plantados nos raios de luz e na lama gelada do pântano...

Sentemo-nos para ouvir o coral angelical que brilha ao meio-dia.

Mentiram. Isto não é o limbo!

Fecharam as celas.

Os carcereiros nos limitaram o espaço, o tempo e o conhecimento.

Atiraram-nos dentro desta esfera sem luz e nos envenenaram com mentiras.

Puseram cicuta em nossas bebidas.

Nossa única sorte é a subsistência.

Sairemos deste tétrico lugar.

Inspiremo-nos na lagarta. A metaforfose.

As respostas!

As verdades!

As malditas palavras soltas sob minha testa não me respondem nada.

As cordilheiras gemendo no frio calmo que nos levam e trazem lembram-me

Que emergi do inferno trazendo em cada mão um punhado de diamantes brutos.

A estas horas envelhecidos estão e de nada me valem.

Arruinei-me ao contar com o relógio

As horas se foram levando resquícios das palavras soltas sem nenhum propósito

Ignoro-as tentando dizer-me algo que ressuscite-me.

Adormecidas estavam em um beco gelado no limbo, e eu as vi.

Fazem parte do inferno.

Meus diamantes brutos deslizam no lodo a caminho do abismo, não importa. 
De nada me valem.

Nenhum ruído ouço agora.

Manifesto apenas apenas a dor das limitações.

21/10/2006

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Catedral


   Olhem a Catedral.  Aí estão os santos?
   Vi apenas anjos esculpidos em relevo nas paredes amarelo      ouro.
   Têm lindos olhos os meninos anjos.
   Que dó tenho eu dos meninos anjos.
   Observam o pássaro que se recolhe triste e encolhido sobre    um fio elétrico
   Num poste bem à frente de seus olhos de gesso enquanto          cai a chuva.
   Ai! Que medo tenho de ver meus olhos transformaren-se          também nesses olhos de gesso.



    Corina Sátiro – 10/03/1996

sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

A Consciência Espiritual

Sempre venho de  dentro e amo algumas coisas que vejo aqui fora
Amo meu corpo moreno doado a mim ao nascer e dele cuido para o meu bem viver
E quando aqui do outro lado, vendo as coisas -  de  fora para  dentro - não as vejo em alguns
Tenho pena de não poder ver as crianças levantarem-se  orgulhosas de si mesmas nas manhãs ao olharem aqui fora algumas coisas (crianças aprenderão olhar tudo se as ensinarmos)

Vejo os caminhos longos nos passos infelizes das almas que nada olham
Contudo, compensa-me viver a minha natureza
Um dia o arrulhar de pássaros azuis
Noutro dia o silêncio no piano calado na sala para que eu possa ouvir o rouxinol

Abracemos os vales verdes enquanto há tempo
Perdoemos os erros mortais - os de dentro e os de fora
Licenciem-me para adentrar meu eu agora
Pois já anoitece e não me vejo aqui fora

Sempre venho de  dentro...
Que adentre a mim as coisas de dentro, não às de fora
Sei bem o que é a beleza infinita das coisas ao olhar
Algumas pessoas de fora para dentro através de suas almas que passeiam

Se viesse de dentro de todas pessoas esse amor...
E se olhassemos todos de fora para dentro?
Atentem-se para  as coisas de dentro
Respirem, filtrem o que nos doam os arvoredos e o devolvam ao tempo lá fora


11/12/2015

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Sem Palavras


 

A chuva desceu na luz dos olhos.

Nasceu um arco-íris e explodiu em cores no ar !

Perdi as palavras.

Perdi o sono e meu lugar na calçada.

Você passou tão longe...

Pensei que podia sonhar,

Mas a luz dos olhos ofuscava meu tempo vazio

Sem dor,

Sem ilusão.

Não quis dizer adeus.

Não disse nada.

Apenas observava as cores do arco-íris

Que faziam-se e  desfaziam-se à minha frente

Como se brincassem com minhas incertezas.

Posso ter você mesmo assim.

Tenho seus olhos me olhando de manhã.

  

Corina Sátiro – 05/02/2000

O Lago

A vontade do lago verde cheio de cisnes e gansos

Era ter teus pés alcançando suas profundezas  

E com o vento refrigerante que nos beija suavemente

Chega o som de um violino quase atônito aplaudindo a eclosão das flores

 

Esses olhos de seda em mim ...

Sei que a dilatação de minhas pupilas não é por falta de luz

Posso afirmar que descobri em ti o sol de  todos os dias

E os anjos invisíveis me presenteiam com a paz todas as noites

 

Pasmo a olhar quanta felicidade há nos espelhos d`água

Aos invadir tuas vestes abrindo caminhos, descobrindo teus anseios,

E minhas pupilas dilatam-se ainda mais observando-o

Minhas emoções se refletem no teu doce olhar que me percebem a emoldura-te  

 

Nossos anéis escondidos nas asas do cisne branco

Surpreendentemente brilham lançando raios de luz em tua pele branca

E nosso futuro tem filhos de todas as cores, tem acenos de paz ao mundo inteiro.

 

Corina Sátiro – 24/11/2006

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Antes do Fim

Ele foi atirado aos leões

E estraçalhado gritou, acho que foi o último grito na arena.  (espetacular!)

Talvez tenha sido o final de dois gladiadores hostis,

Olhou o céu chuvoso e correu adentrando os labirintos contemporâneos, a fugir da decência.

A dor era visceral!

Ouviu a voz da deusa que o negociou

E o valor era bem menor do que havia sido pago ao adquiri-lo.

Seus dotes eram razoáveis, sua enfermidade o desvalorizava...

Seus dentes rangiam e mastigavam a febre.

Coração comprimido, arrancado pela boca com mãos insanas guiadas pelo cérebro adoecido da dama em chamas.

- Compramos e vendemos pessoas?

- Leiloamos pessoas?

- É lícito isto? Diga-me Senhor!

Seria o triste assassinato do meu eu lírico ao ouvir?

Vociferada fora a dor em silêncio e somente meu eu a ouviu.

“Vendam o gado!”

“ Comam gado!”

“ Arrastem-os para os seus leitos e os comam dormindo!”

Era o pesadê-lo!

O fim da “guerra fria.”

Ao cobrir meus ouvidos com as mãos,

Cá estou eu a brilhar de dor.
 

Corina Sátiro – 28/10/2015